José Travaços Santos

Apontamentos sobre a História da Batalha (201)

Um passeio pela Vila (II)

Poesia

 

Há poesia

quando um raio de sol

na vidraça

quebra a monotonia

do meu quarto escuro

e torna menos duro

estar num quarto escuro

sem um raio de sol

na vidraça.

 

 

Iniciámos no número de Dezembro esta breve visita a alguns recantos da nossa Vila, começando no espaço de grande interesse histórico e religioso, o de Santa Maria-a-Velha, primeiro templo da Batalha e panteão de mestres do Mosteiro, de que reproduzo, mais uma vez, a fotografia, possivelmente dos anos 20 do século XX, do edifício ainda completo, vendo-se o corpo da igreja e a sua capela mor, tudo ainda em bom estado, o que nos leva a perguntar o que motivou a sua demolição, primeiro a nave e depois a capela mor, destruindo-se assim o único testemunho do nascimento da povoação e do primeiro monumento em que se preservava a memória dos mestres.

Terminávamos a visita na capelinha de Nossa Senhora do Caminho e, agora, vindo pela rua que regista esta invocação da Santíssima Virgem, a caminho da praça de Mouzinho de Albuquerque vamos passar pela Casa Barros, o estabelecimento mais antigo da Vila, fundado em 1895 pelo avô e bisavô dos actuais proprietários, Alfredo do Nascimento Barros.

Entrados na praça, encontramos à nossa esquerda o edifício do Turismo e a propósito de turismo resta-nos lamentar outra perda, que inequivocamente prejudicou a Alta Estremadura, a da Região de Turismo de Leiria, que séculos de história comum, de ligações administrativas, de proximidade e de afinidades uniam naturalmente e justificavam a sua continuidade. Leiria, Batalha, Porto de Mós, Alcobaça, Nazaré, Marinha Grande, Pombal, Ourém, e mais alguns vizinhos, deviam continuar unidos e defender os seus interesses específicos numa região turística própria, numa região sua a que têm todo o direito, só ela capaz de gerir e revelar as suas peculiaridades. Aquela linha de Nazaré, Alcobaça, Batalha, Fátima e, porque não?, Tomar, tantas vezes seguida pelos turistas, não pode continuar quebrada sem se atentar contra o bom senso. Que saudades da Rota do Sol, região tão bem delineada e que tantos serviços prestou à Alta Estremadura! Entre vários dos seus obreiros, todos a merecer destaque, recordo os Dr. Rui Acácio da Silva Luz e Dr. Rui Garcia da Fonseca, curiosamente ambos médicos,

A antiga Praça Municipal passou a ser designada por praça de Mouzinho de Albuquerque na sessão de 15 de Março de 1898 da primeira Câmara eleita depois da restauração do Concelho da Batalha. Era presidida pelo Comendador Joaquim Sales de Simões Carreira. A homenagem à memória de Joaquim Mouzinho de Albuquerque justificava-se por ser um natural da paróquia da Batalha, nascido na Quinta da Várzea em 1855. Esta quinta foi adquirida, na venda dos bens da Ordem Dominicana, por Luís da Silva Mouzinho de Albuquerque, avô do glorioso combatente pela presença portuguesa em Moçambique naquela disputa por terras africanas que então estava acesa e envolvia várias potências europeias com os nossos aliados ingleses a quererem ficar com um generoso quinhão dos territórios que administrávamos.

É oportuno lembrar que Luís da Silva Mouzinho de Albuquerque, que baptiza a rua que passa em frente do posto da Guarda Nacional Republicana, dirigiu as obras de restauro do Mosteiro de Santa Maria da Vitória entre 1840 e 1844, travando a ruina iminente do Monumento, descuidado desde a saída dos Dominicanos em 1834 e ocupado, com excepção da igreja, que passou a ter funções de paroquial dado o estado em que se encontrava a Matriz, anarquicamente pelo povo e abusivamente por serviços locais e do Estado.

No mesmo topo da praça onde está o posto de Turismo, a umas dezenas de metros está um significativo monumento erguido à memória de Joaquim Mouzinho de Albuquerque, encomenda da nossa Câmara Municipal então presidida por António Lucas e obra do saudoso escultor e pintor batalhense Fernando Vieira Belo.

As casas da praça são das poucas salvas das demolições do plano de urbanização da década de 60 do século XX, embora várias com alterações que as descaracterizaram. Creio que foi neste espaço nobre da nossa Vila que esteve sempre o edifício dos Paços do Concelho, o que nos é indicado, sobretudo pela localização do belo pelourinho manuelino, levando.me a pensar que o primeiro edifício seria sensivelmente onde está presentemente a casa de António Costa Coelho. Este edifício já estava em estado calamitoso no século XVIII, o que levou a vereação e o povo a enviar uma petição à Rainha D. Maria I para que lhes acudisse no sentido de o restaurar. Da resposta da Rainha nada sei mas a verdade é que acabou por surgir um novo Paços do Concelho que, já sem essa função, ainda se ergue na praça e é um prédio digno de estar nas proximidades do Mosteiro. Tem hoje a designação de Edifício Mouzinho de Albuquerque e entre outras instituições alberga o Arquivo Municipal e o CEPAE (Centro do Património da Alta Estremadura). No rés-do-chão tem uma galeria para exposições. Funcionou neste mesmo rés-do-chão a Comissão de Turismo. Quando era presidente da Câmara o Dr. Francisco Coutinho, os serviços camarários passaram para a casa que pertenceu ao saudoso médico Dr. José Maria Pereira Gens, na altura adquirida para esse fim por aquele autarca.

Na petição enviada a el-Rei D. Carlos I, em Março de 1897, em prol da restauração do Município da Batalha que havia sido extinto em Setembro de 1895 e reintegrado no concelho de Leiria (nesse século foi extinto, e sempre sujeito a ameaças, várias vezes), assinada por um grupo de cidadãos e encabeçado pelo Dr. José Taibner de Morais, diz-se a determinada altura no que se refere ao prédio camarário:

“…Nos anos de 1888, 1889 e 1890 reedificou o paço municipal, onde funcionavam também a administração do concelho, repartição de fazenda, comissão de recenseamento eleitoral e militar, tribunal judicial e aferição de pesos e medidas…”.

Na minha meninice ainda ali estava instalada a cadeia municipal, de que restam, como memória, as duas janelas de grades.

A petição enviada ao Rei D. Carlos I, que além dum notável soberano, sacrificado em 1908 à baixeza dos políticos e da política, foi o nosso maior oceanógrafo, realizando uma aturada investigação do Oceano Atlântico ao longo da costa portuguesa, e um grande artista plástico, verdadeiro mestre na arte da aguarela, foi acolhida favoravelmente por ele que logo diligenciou no sentido do governo se empenhar na restauração do nosso município, o que aconteceu no princípio de 1898.

Até para o mês que vem, se Deus quiser.


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