João Pedro Matos

Tesouros da Música Portuguesa

Tony de Matos, o destino de um romântico

O Destino Marca a Hora, de 1970, é um filme de Henrique Campos em que participa Tony de Matos. Contracenando com Isabel de Castro e Eugénio Salvador, o fadista interpreta o tema que dá nome ao filme, cuja letra diz que o que rege a sorte agora, foi escrito outrora, logo ao nascer. E o destino de Tony Matos estava traçado quando veio ao mundo num berço de artistas.

Nascido na cidade do Porto em 1924, e batizado António Maria de Matos, desde muito cedo tomou contato com o teatro, porquanto a sua mãe e o seu padrasto eram atores da companhia itinerante Rafael Oliveira, Artistas Associados. Nessa mesma companhia, com apenas treze anos, já desempenhava a função de ponto e cantava no final dos espetáculos.

Aos vinte anos, vai para Lisboa onde consegue ingressar como cantor na Emissora Nacional. Em 1948 estreia-se no Café Luso, casa que o contrata por dois anos. Mais dois anos volvidos, grava o seu primeiro disco que é um sucesso retumbante: Cartas de Amor.

No ano de 1953 vamos encontrá-lo pela primeira vez no Brasil, país que o acolhe calorosamente e onde se fixa quatro anos mais tarde. Em Copacabana irá abrir o restaurante típico O Fado. A par de atividade como artista naquele restaurante, atua na rádio e televisão do Brasil, designadamente na Rádio TV Tupi.

Corria o ano de 1963 quando decide voltar a Portugal, sendo então eleito Rei da Rádio Portuguesa. Nessa altura, havia já gravado êxitos como Só Nós Dois, Vendaval, Lado a Lado ou Procuro e Não te Encontro. Galardoado com o Prémio de Imprensa da Música Ligeira de 1964, Tony de Matos faz também uma interessante carreira no cinema, destacando-se como ator nos filmes Rapazes de Táxis (1965), Bonança & Companhia (1969) ou Derrapagem (1972).

Em 1974 aventura-se pelos Estados Unidos, numa digressão brilhante, fixando residência naquele país durante oito anos. Regressa outra vez a Portugal para abrir um restaurante em Lisboa de parceria com Carlos Zel e Filipe Duarte.

Em 1985 edita o seu segundo álbum, Romântico, e é recebido em apoteose no concerto que dá no Coliseu dos Recreios, concerto em que foram convidados Carlos Zel e Maria da Fé.

Por seu turno, Herman José convidou-o para participar no primeiro programa da série Humor de Perdição. Cantor Latino é o título do seu derradeiro álbum que é lançado em 1988 e para o qual escreveram canções autores como Paulo de Carvalho, Rui Veloso, João Gil, Carlos Mendes ou Tozé Brito. Decorrido um ano, viria a falecer, no Hospital de Santa Maria, em Lisboa.

Tony de Matos cantou o amor de forma apaixonada, exacerbada quase ao grau do desespero ou da loucura. Mas não podemos esquecer o grande ator que ele era, e parafraseando Fernando Pessoa, o poeta é um fingidor. De qualquer modo, o seu poder interpretativo era tal que provocava o efeito de paixão única e arrebatadora, que transmitia ao ouvinte a sensação de excesso sentimental. E se a arte é essencialmente um efeito, então grande é a arte de Tony de Matos, porquanto o excesso transmitido transporta o ouvinte ao nível do amor jamais encontrado (dir-se-ia mesmo impossível), ou à intensidade de paixão e ciúme insuportáveis.

Em 2019 completa-se trinta anos sobre a sua morte e não podíamos deixar de assinalar essa efeméride. Do seu vasto reportório (Tony de Matos gravou cerca de uma centena de singles), salientam-se naturalmente as canções A Tal, Quando Cai uma Mulher, De Homem Para Homem, Vendaval, Cartas de Amor, Lugar Vazio, De Bar em Bar, O Destino Marca a Hora, Poema do Fim, Só Nós Dois, Cantor Latino. Conotado durante muito tempo com o chamado nacional cançonetismo, Tony de Matos é hoje considerado como um dos principais fadistas do século XX. Honremos a sua memória.


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