José Travaços Santos

Apontamentos sobre a História da Batalha (224)

Pequeno guia para uma visita ao Mosteiro (II)

Não é tanto uma visita ao Mosteiro mas, antes, uma visita a certos pormenores do monumento que, normalmente, passam despercebidos. Falei já das duas imagens de Nossa Senhora da Anunciação ou da Expectação, a Senhora do Ó como vulgarmente é designada, dos homens verdes e dos anjos músicos. Os dois conjuntos dos anjos músicos, um nas arquivoltas do pórtico principal e o outro lá muito no alto no capitel da quarta coluna, à esquerda de quem entra na igreja, dão-nos preciosas informações sobre os instrumentos musicais usados nos séculos XIV e XV e têm especial interesse para os músicos do nosso tempo e sobretudo para a gente ligada às manifestações folclóricas. Nessa quarta coluna está também a escultura do “homem verde”, lançando os dois ramos pela boca. Só vamos encontrar outro “homem verde”, que eu saiba, na Casa do Capítulo, no canto esquerdo do lado nascente, neste apenas um rosto humano com os ramos expelidos pela boca. Estou longe de perceber o significado destas esculturas que existem em diversos monumentos cá e no estrangeiro.

Há porém ainda, que eu saiba, mais três esculturas a revelarem-nos os instrumentos musicais medievais: uma, no canto noroeste, próximo da entrada do museu do Soldado Desconhecido, no Claustro Real, aqui também um anjo músico, e nas paredes exteriores das Capelas Imperfeitas, duas figuras tangendo instrumentos de cordas. Só a descrição destes conjuntos e o respectivo estudo, a fazer não por mim que sou um simples curioso mas pelos entendidos, daria para várias páginas do jornal.

Regressemos e voltemos a entrar na igreja pela porta principal, a porta voltada ao Poente, e, já agora, convém lembrar que não foi aí que começou a construção do Mosteiro mas, sim, nas capelas absidais, quero dizer pela cabeceira da igreja.

Logo à entrada deparamos com a sepultura do Mestre Mateus Fernandes e de sua mulher Isabel Henriques e doutros familiares. Mateus Fernandes, que se crê natural da Covilhã, dirigiu as obras do monumento de 1490 a 1515, ano em que faleceu. Nos finais do reinado de D. Afonso V, em 1480, é nomeado também um Mateus Fernandes, que o rei despede da direcção da obra por menos competência, mas não está apurado se era o mesmo e muita coisa me leva a crer que não era. É o covilhanense Mateus Fernandes o iniciador do estilo manuelino, tendo começado pela ornamentação dos arcos do Claustro Real e continuado no fabuloso pórtico das Capelas Imperfeitas. Foi, também, o autor do pelourinho, um dos mais belos do País, que estupidamente foi destruído à volta dos anos 60 do século XIX. Existe no nosso tempo a belíssima réplica executada pelo Mestre Alfredo Neto Ribeiro apenas alterada no cimo que não se vê nitidamente na gravura da editora Pallhares executada no primeiro decénio do século XIX, sendo certo, porém, que não tinha a pedra de armas da Vila da Batalha, ornato não habitual nos pelourinhos.

Mateus Fernandes, como antes já tinha acontecido com Afonso Domingues e acontece um pouco com todos os mestres da Batalha, verdadeiro escol de arquitectos, dos mais notáveis daquele tempo, também está envolvido nalguns mistérios de que, embora muito por alto darei conta, evidentemente sem ter capacidade para os desvendar.

A Mateus Fernandes sucedeu na direcção das obras seu filho de igual nome próprio. Aliás os seus filhos, na Batalha e nas Caldas da Rainha, continuaram com mérito a actividade do pai. Outro familiar seu foi Boutaca, casado com uma filha do mestre.

Boutaca ou Boitaca, aportuguesamento de Boytac, seria talvez de nacionalidade francesa mas, na verdade ainda não se conseguiu apurar a sua origem. Em documentos da Confraria do Hospital de Santa Maria da Vitória, hospital que el-Rei D. João I criara em 1427, nos finais da segunda década de 1500 aparece a sua assinatura, simplesmente Boytac, sem o nome próprio que evidentemente nada comprova que fosse Diogo. O apelido é antecedido por Maitre ou Mestre.

Sobre os mestres batalhinos convém consultar as obras do Professor Doutor Saul António Gomes que é, além do maior historiador da actualidade, o que publicou a mais vasta e sólida matéria sobre o Mosteiro e a Batalha. Outra consulta obrigatória é a do “Dicionário Histórico e Documental dos Arquitectos, Engenheiros e Construtores Portugueses” de Sousa Viterbo.

Ora Boutaca não tendo sido arquitecto, permita-se o termo, do Mosteiro, aqui realizou algumas obras entre elas os ornatos da fonte dos frades e o pórtico da Igreja Matriz.

Mal tínhamos entrado na igreja conventual e logo me desviei do traçado da visita, mas há tanta coisa a dizer sobre o monumento que é natural isso acontecer.

Vista a sepultura de Mateus Fernandes, logo à nossa direita e a curta distância do panteão real, a capela do Fundador, há duas campas, uma de Diogo Gonçalves de Travaços, que foi aio dos filhos do Infante D. Pedro, e a outra de Martim Gonçalves de Macedo ou da Maçada, que salvou a vida ao Mestre de Avis na decisiva batalha de Aljubarrota. Pode dizer-se que Gonçalves de Macedo, que creio natural de Macedo de Cavaleiros, salvando a vida do rei português salvou a independência da nossa Pátria e a liberdade do Povo Português.

Hoje ficaremos por aqui. Até ao próximo número, se Deus quiser.

 

Eleições em Janeiro

 

Em breve começará a campanha dos partidos concorrentes à Assembleia da República, altura própria para os partidos nos esclarecerem sobre assuntos que raras vezes ou nunca são focados mas que são de capital importância.

Ei-los:

Cooperativismo

Embora o Estado não se possa intrometer na vida das cooperativas, que pensam os partidos sobre o sistema e sobre a necessidade da sua divulgação sobretudo nos diversos graus do Ensino.

Mar

Que fazer para um aproveitamento do vasto território marítimo português. Que providências a tomar, também na defesa e incremento da pesca.

Agricultura

Como apoiar decisivamente a nossa agricultura, que modificações, que apoios, e o mais importante é o apoio técnico, que providências para salvar uma actividade que é imprescindível e para lhe proporcionar alicerces firmes e duradoiros.

Língua Portuguesa

Que providências, aliás urgentes, para salvar a invasão constante de termos ingleses. Como criar e instalar o Museu da Língua Portuguesa.

Descobrimentos

Que Museu a focar o esforço sobreumano, a espantosa capacidade, a inventiva e os serviços que os Portugueses dos séculos XV e XVI prestaram ao Mundo quanto ao avanço da navegação, ao conhecimento do Planeta, à descoberta dos céus, a várias outras descobertas de elevado interesse científico.

Círculos Eleitorais

Que pensam da criação de círculos uninominais e doutras alterações que reforcem a representatividade popular, tornando muito particularmente os deputados a voz do Povo e não a voz dos partidos.

Televisões

Que providências para evitar que as televisões sejam meros canais de violência que caracteriza, e cada vez mais, as produções cinematográficas.

 

Fotografia

Imagem já com alguns anos revelando o trabalho que é constante na limpeza e preservação do Mosteiro. Lá no alto, corajosamente o Luís Matias Ceiça, funcionário duma dedicação rara, tenta destruir as perigosas ervas daninhas que são uma praga difícil de combater.

 


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