João Pedro Matos

Tesouros da Música Portuguesa

O Minho a toque de caixa

O acervo de música tradicional do Minho é riquíssimo, porquanto está ligado diretamente aos trabalhos de campo que se faziam antigamente (como as sachas, as esfolhadas ou as espadeladas) e às festas e romarias que acontecem anualmente naquela região.

Para nomear algumas, não podemos esquecer as Gualterianas em Guimarães, a da Senhora da Agonia, em Viana do Castelo, o Bom Jesus de Braga, a de Santa Rita em Caminha, a Feira das Cruzes em Barcelos e São Bento da Porta Aberta em Paredes de Coura.

Nestas festividades, retumba a toada de zabumbas, entre o som da concertina e as marchas das filarmónicas, toada silenciada momentaneamente pelo abundante e estrondoso fuguetório. Uma palavra para os trajes que abrilhantam estas romarias, com natural destaque para o chamado traje de noiva de Viana, caracterizado pela riqueza de ouro. Numa profusão de fios, arrecadas, cruzes e medalhas religiosas que se exibem em quilates bem avultados, realça o coração de filigrana, a peça mais valiosa dos trajes das romarias nortenhas.

A música do Minho transborda de ritmo, alegria e movimento, traduzindo-se nas danças tradicionais, como sejam o Vira, a Chula e o Malhão. Há cantigas que são incontornáveis, como o Verde Gaio, a Cana Verde ou o Pai do Ladrão. Os instrumentos que as acompanham são as braguesas e os cavaquinhos, as pandeiretas, os ferrinhos, entre outros. Mas o instrumento mais alegre do seu folclore é a voz (principalmente a voz feminina), que no tom de falsete entra em desgarradas com outras vozes, dando o mote para a festa.

Foi neste fecundo terreno etnográfico que o projeto Toque de Caixa enraizou, e de uma maneira geral em todo o cancioneiro tradicional português. Mas sentindo proximidade com a ETNIA, cooperativa cultural dedicada à divulgação da cultura de raiz tradicional, sediada em Caminha, os Toque de Caixa procuraram desde cedo compor sobre a recolha do cancioneiro nortenho.

O grupo surgiu em 1986 e logo teve a preocupação de fazer o casamento entre a tradição e a modernidade, sempre na busca do reportório mais autêntico e que reflectisse as vivências das gentes do Minho, mas também de Trás-os-Montes e das Beiras. Utilizando uma expressão da autoria do grupo de Abílio e Albertina Canastra, o primeiro álbum foi um lento marinar para o apurar, ao gosto dos Toque de Caixa.

Assim, sete anos depois da fundação do projeto, editam Histórias do Som, disco que foi considerado pela crítica especializada como o melhor trabalho de música popular portuguesa de 1993. E igualmente foi lançado no estrangeiro, através de uma prestigiada editora de Nova Iorque que assegurou a sua distribuição a nível mundial.

Durante a sua já longa existência, os Toque de Caixa participaram em diversos festivais de renome internacional, como por exemplo no Garden Festival e no European Arts Festival, sem omitir os festivais de Llangollen e de Pontardawe (estes últimos no País de Gales). Constituem, por isso, menção obrigatória em qualquer discografia sobre a música tradicional portuguesa, mormente por causa do álbum Histórias do Som que contém verdadeiras pérolas: À Saída do Carro, Fantasia Minhota, Tirana, Agora Baixou o Sol/Alvorada, são algumas das preciosidades que podemos encontrar neste registo de longa duração.

Os músicos que nele participaram, para além de Abílio (na voz) e Albertina Canastra (na concertina), foram Luís Viegas, Miguel Teixeira, Rosa Pilão e Tereza Paiva, sem esquecer o Edgar (nas percussões), o Emanuel (no violino) e o Horácio (na viola braguesa).

Em 2010 os Toque de Caixa lançaram o seu segundo álbum, intitulado Cruzes, Canhoto!, o qual prosseguia na senda da qualidade anteriormente demonstrada em Histórias do Som.


NESTA SECÇÃO

“A Quaresma do deserto não é negação da autoestima”

(…) A nossa Quaresma recorda, não apenas a história de Israel, mas também a história pessoal...

Nª Srª das Candeias e a tradição dos fritos na Freguesia de São Mamede

Diz a tradição popular portuguesa que a 2 de fevereiro, dia de Nossa Senhora das Candeias, s...

Duarte Costa, um mestre da guitarra quase esquecido

Acontece que no domínio das artes, seja na literatura, na pintura, na escultura ou na música...