Francisco Oliveira Simões (Historiador)
Crónicas do passado
O Embuçado
Os nossos intrépidos heróis faziam um percurso incrível por terras muçulmanas da Andaluzia, comandados pelo Mestre D. Paio Peres Correia. Rumo a Sevilha, onde iriam montar o cerco, frente aos almóadas. O que aqui vos transcrevo são as memórias redigidas pelo escudeiro de D. Pero Martins de Macedo, o Raimundo. Nesta amena conversa discutia-se a existência do ser e a vida em busca da verdade absoluta. Como dizia Jean-Jacques Rousseau o homem nasce...
Raimundo - Já te calavas, o relato é meu, não teu, queres ganhar mérito à minha conta?
Desculpe, não foi minha intenção causar contratempos entre nós.
Raimundo - Desta vez passa. Vá conta lá a aventura daqueles dois.
Vou começar a narrar-vos a história mui célebre daqueles dois solenes cavaleiros.
D. Pero - Já se comia qualquer coisa.
D. Mendo - Sim uma coisa leve, só para matar a fome.
D. Pero - Que tal um leitão?
D. Mendo - Concordo. É um prato frugal.
D. Paio - Vocês acabaram de comer, não vamos andar sempre a parar e a acampar, senão nunca mais chegamos a Sevilha.
D. Pero - Olhe não quero saber, eu vou caçar. Se o Senhor não tem fome o problema é seu.
D. Mendo - Sim o Senhor D. Pero tem toda a razão.
E assim partiram estes dois valentes cavaleiros em busca do jantar. Apesar dos apelos do comandante D. Paio Peres Correia, que prosseguiu a sua viagem sem olhar para trás.
Raimundo - Senhor D. Pero vejo além uma fogueira com homens e cavalos ao seu redor.
D. Pero - Não sejas ridículo, não vamos interromper aqueles nobres senhores.
Raimundo - Mas são mouros Meu Senhor.
D. Pero - Não são nada. Só por usarem turbante?
D. Mendo - Vou lá falar com eles.
Raimundo – Senhor, tenhais cuidado!
D. Pero - Está calado seu insolente.
D. Mendo - Os senhores davam-nos a honra de nos juntarmos a vós e dividirem o vosso repasto com estes nobres cavaleiros cristãos.
Ouvindo estas palavras mágicas, os muçulmanos prenderam os três cavaleiros, sob o som dos seus gritos de vitória.
Raimundo - Eu avisei...


D. Pero - D. Mendo quando regressarmos lembra-me de pôr este imbecil nos calabouços.
Quando ninguém esperava apareceu um cavaleiro embuçado, que de espada em riste matou com destreza todos os infiéis. E desamarrou os nossos ilustres cavaleiros.
D. Mendo - Olha muito obrigado pela tua ajuda, mas claro que nós nos safávamos sozinhos. Não és nada mau para um principiante, sim senhor.
D. Pero - Bem vamos comer estes petiscos que nos deixaram. Eu vou já despachar um javali.
D. Mendo – Ah sacrilégio. Não há nada de porco nem leitão. Estes mouros não sabem o que é bom.
Raimundo - Desculpem Senhores, mas ninguém se pergunta quem é o sujeito que nos ajudou?
D. Pero - Pois é, que indelicadeza, quer uma perna de frango para dar ao dente?
Neste momento o embuçado retira o capuz, ou o capelo, revelando o seu rosto. Era El Rei de Portugal. Isto até me lembra um fado qualquer.
D. Mendo - Agora sim, está tudo às claras. Vá sente-se aqui no chão e petisque connosco.
Raimundo - É El Rei D. Sancho II.
D. Pero - Claro que é e eu sou o Papa Inocêncio IV. Raimundo deixa de ser jogral e come.
D. Sancho II - Como podem vós duvidar que sou El Rei de Portugal.
Os dois nobres ajoelham-se e tecem-lhe elogios.
D. Mendo - Vossa Alteza é vitoriosa e fiel ao Deus altíssimo, já agora estava de olho numas terras lá para os lados do Minho.
D. Sancho II - De mim não terão nada seus gananciosos.
D. Pero - É da maneiro que defendo o seu irmão D. Afonso, nunca gostei de Vossa Alteza.
D. Sancho II - Vós sois a escória do Mui Nobre Reino de Portugal.
Dizendo estas palavras montou o seu cavalo e partiu para Toledo, onde estava a sua corte durante a guerra civil com o irmão D. Afonso. Entretanto D. Paio Peres Correia conseguiu alcançar os seus três cavaleiros.
D. Paio - Finalmente vos encontro.
D. Mendo - Aqui vos entregamos os corpos destes desleais sarracenos, que jazem na nossa terra cristã imaculada. Matámo-los com a espada dos justos, sob os seus gritos de misericórdia.
Ao mesmo tempo que todos se debruçavam para prestar homenagem aos dois nobres heroicos e destemidos, D. Pero tapava a boca do seu sempre leal escudeiro, que esbracejava.
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