José Travaços Santos

Apontamentos sobre a História da Batalha (216)

Nos 521 anos da Vila e do Município da Batalha

 

A Pomba

(Sobre o poema “o Arco” do poeta hispano-árabe de Múrcia Al-Buqayra, do século XII, relembrando o interesse que há em estudar esta também nossa herança cultural)

 

A pomba está pousada

no ramo da árvore,

mas mal pode imaginar

que esse ramo,

que hoje é seu amigo

e lhe dá abrigo,

se irá transformar

no arco da flecha

que a há-de matar.

 

 

 

O Poeta Dr. Afonso Lopes Vieira (que foi proclamado em 1937 filho adoptivo da Batalha) chamava aos municípios as “pequenas pátrias”, aquelas pequenas pátrias onde é possível o pleno uso da cidadania e a intervenção de cada um nas decisões do Poder.

Na realidade, os municípios foram sempre o precioso alicerce da liberdade popular e neles se desenvolveram instituições que bem reflectiam essa sua natureza, como a Casa-dos-Vinte-e-Quatro onde os representantes dos doze ofícios (dois representantes por cada ofício) decidiam efectivamente no que lhes dizia respeito e também em vários aspectos da governação da cidade e do reino. O juiz do Povo, presidente da instituição e eleito pelos seus pares entre os vinte e quatro, tinha, no caso da cidade de Lisboa, direito a participar nas audiências reais, o que bem revela a importância de que se revestia. Porém, nem todos os municípios albergavam esta original instituição, que, com certeza, era apanágio apenas dos principais.

A Batalha, nascida do Mosteiro de Santa Maria da Vitória neste recanto do Vale do Lena, pelo afluxo e fixação dos que vieram trabalhar na obra monumental e dos que iam povoando os cabeços circundantes e foram desenvolvendo a agricultura, logo em meados do século XV começou a pensar e a pedir a criação do seu município a separar do de Leiria. Como disse o Historiador Professor Doutor Saul António Gomes “já um pouco antes de 1459 os batalhenses se haviam sublevado contra Leiria e procedido por vontade unilateral, à demarcação dum termo de concelho autónomo”. Evidentemente que o então monarca D. Afonso V o não permitiu quer por achar a pretensão prematura, quer pela oposição de Leiria.

Entretanto a povoação foi crescendo e desenvolvendo-se o seu aro pelo que passados cerca de 50 anos D. Manuel I, acumuladas as razões do progresso local e as da importância dum sítio onde se erguera o principal monumento português, obra máxima da dinastia a que pertencia, evocação do feito maior na consolidação da independência pátria e da época mais brilhante da história nacional, panteão da sua família, concede-lhe a autonomia desejada, demarcando em 17 de Março de 1500 o território do novo município e elevando a povoação a vila no dia seguinte.

Com certeza que o novo município teria tido foral, constando até, mas sem grande fundamento, que o houve em 1504. Creio porém, sem o poder confirmar, que o seu foral seria cópia dos doutros municípios.

A verdade é que além das duas cartas régias, uma a demarcar o território e outra a elevar a Batalha a vila, logo lhe foi entregue a caixa de pesos, um belíssimo exemplar que hoje está patente no Museu da Comunidade Concelhia, o original resguardado numa vitrina e uma réplica para os visitantes poderem tocar e analisar. Abro um parênteses: no original está gravado o ano de 1499, o que fez crer que o nosso município datava daquele ano. Contudo, aquele ano indica apenas a feitura de várias caixas daquele modelo, distribuídas a diversos concelhos.

Digamos que a caixa de pesos é o símbolo do poder económico local, enquanto o pelourinho, com que a Batalha pouco tempo depois também foi dotada, é expressão do poder administrativo e da justiça locais.

Erguido o pelourinho, como acontecia com todos, em frente da casa da Câmara, que, na Batalha, se situaria pela actual praça de Mouzinho de Albuquerque, até 1898 denominada de praça municipal ou do Município, não obstante as suas singularidade e beleza e o seu valor histórico, na década de 60 do século XIX foi pura e simplesmente arrasado, vileza que se repetiu noutros municípios e que continua a ser uma pecha, entre nós, a pedir urgente tratamento psiquiátrico.

Do pelourinho restam hoje a belíssima réplica, apenas alterada no cimo por ser impossível descortinar o remate na gravura da litografia Palhares, feita no princípio do século XIX, e esta própria gravura.

A réplica é obra do saudoso Mestre Alfredo Neto Ribeiro, devendo-se a iniciativa à Câmara Municipal então presidida por António Lucas.

É curioso referir que um cruzeiro que está em frente do templo da nossa Misericórdia chegou a ser classificado, não sei porque artimanhas, como monumento nacional, classificação no mínimo leviana, pois o cruzeiro que deve datar do século XVIII, não tinha estrutura para ser um pelourinho, nunca tendo sido outra coisa senão um cruzeiro. Ainda bem que o erro foi emendado.

A destruição do verdadeiro pelourinho, obra que se supõe do Mestre Mateus Fernandes e talvez o primeiro do estilo manuelino, é-nos relatada pelo investigador Sá Vilela no número 127, de 4 de Junho de 1907, do semanário “Leiria Ilustrada”, quando diz que “há cerca de 40 anos, ele foi destruído por um acto vandálico…”.

No século XIX, ao sabor dos interesses dos partidos liberais, o concelho da Batalha foi várias vezes extinto e restaurado. A última extinção é de 1895, conseguindo-se nesta última acabar, creio, com esta dança de extinções e restaurações. Na altura um grupo de batalhenses e de reguenguenses, encabeçado pelo Dr. José Taibner de Morais, criou um vigoroso movimento que se dirigiu ao Rei D. Carlos I apelando para o seu apoio, que rapidamente lhe foi concedido. Em princípios de 1898, o concelho estava restaurado.

A vereação, logo a seguir eleita, era presidida pelo Comendador Joaquim Sales.

Segundo a investigação, na Torre do Tombo, feita pelo inesquecível João Madeira Martins, um estudioso que na sua reforma se dedicou a averiguar a história da nossa região, no século XVIII os Paços do nosso concelho estavam em ruínas pelo que os batalhenses fizeram uma petição à Rainha D. Maria I, pedindo-lhe que lhes acudisse.

Não sei qual foi a resposta da soberana mas a verdade é que no século XIX já havia uma nova Casa da Câmara, que naquele tempo agregava todos os serviços públicos. O edifício é aquele que hoje tem o nome de Mouzinho de Albuquerque.

No dia 18 de Março, a nossa Câmara tomou a iniciativa de celebrar a data, que todos os anos deve ser festejada e aproveitada para lembrar a importância dos Municípios e a necessidade da sua autonomia plena, pequena pátrias onde a Pátria grande tem os seus alicerces mais seguros e onde as Democracias têm as suas raízes mais autênticas e mais fortes.

 


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