Ana Caseiro (Cozinheira)

À Mesa

Marmelada de marmelos

Nos manuscritos da infanta D. Maria podemos encontrar a seguinte receita: “marmelada de Ximenes”, que é, “façam uma calda com dois quilos de açúcar, em seguida pesem quilos de marmelos, já descascados e limpos, e ponham-nos na calda, que já estará no fogo. Quando as frutas tiverem cozidas, tirem-nas da calda, amassem-nas, passando-as depois por uma peneira fina, Enquanto isto a calda ficará no fogo, até atingir o ponto bala. Então, tirem a calda do fogo e adicionem-lhe o marmelo, mexendo tudo durante bastante tempo.”

Como o receituário abrande o seculo XVI, este nível elevado de açúcar pode estar associado com a descoberta do Brasil em 1500 e consequente ao acesso ao açúcar, uma especiaria naquela altura cara.

A marmelada é um exemplo de receita que se dispersou pelo mundo através dos portugueses e sobreviveu intacta. A palavra marmelada foi replicada a partir do português para outras línguas como “marmelade” em francês, “marmellata” em italiano e “marmelade” em inglês.

A existência dos doces de frutas é anterior ao seculo XV. Na Grécia antiga o marmelo era conhecido como maçã-mel. Os marmelos eram descascados e limpos e colocados em cru dentro de frascos cobertos com mel. Estes preparados eram usados em fins medicinais, primeiro por gregos e posteriormente pelos romanos.

A marmelada chegou a Inglaterra através de comerciantes portugueses em finais do seculo XV. A primeira referência ocorre no ano de 1524 quando o nobre Hull of Exeter ofereceu “one box of marmelade…” (uma caixa de marmelada) ao rei Henrique VIII. Os britânicos utilizaram essa técnica e aplicaram-na às laranjas. Daí a razão de a marmelada inglesa tradicional ser feita com casca e polpa de laranjas sevilhanas.

Só a partir do seculo XVIII é que as marmeladas deixaram de ser um doce consistente que se podia cortar com a faca e se diversificaram em compotas e geleias, desde maçãs, peras, ameixas, cerejas e melão.

Em Portugal D. João V adorava os doces feitos no Mosteiro de Odivelas, onde o monarca se deslocava com alguma frequência atraído por outros prazeres e pela marmelada que atualmente existe.

A marmelada do Mosteiro de Odivelas tem uma particularidade, tem uma cor mais clara, quase branca, mais que as típicas marmeladas com tons castanhos ou tons de mel. Este doce era oferecido a convidados e visitantes do mosteiro como se de um bolo se trata-se.

Apresento aqui uma receita diferente para provar, marmelos assados com laranja, mel e nozes.

 

Receita para quatro gulosos

Ingredientes:

5 unidades de marmelos

Sumo e raspa de 1 laranja

Sumo de 1 limão

Canela em pó q.b.

3 colheres de sopa de mel

2 colher de sopa de açúcar amarelo

100 gramas de nozes picadas

60 ml de vinho do Porto

Preparação:

Primeiro numa taça colocar água fria e sumo de 1 limão, de seguida descascar os marmelos, cortar ao meio e colocar nessa taça.

Ligue o forno a 170º e prepare um tabuleiro com os seguintes ingredientes: canela em pó a gosto, o mel, o cálice de Vinho do Porto, a raspa e sumo de uma laranja. Retire os marmelos da taça, tire o excesso de água e coloque toda a fruta no tabuleiro. Envolva todos os ingredientes. Coloque o tabuleiro dentro do forno durante 35 minutos. Ao fim de esse tempo com ajuda de um palito ver se a fruta está tenra (varia com a maturação da fruta), caso ainda esteja dura deixar mais 15 minutos. Sugiro degustar esta delícia com nozes e gelado de baunilha enquanto a fruta está morna.

 


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