José Travaços Santos
Apontamentos sobre a História da Batalha (217)
Duas notáveis poetisas da nossa Região: Maria Adelaide de Lemos Oliveira Simões
Embora natural de Torres Novas veio ainda menina para a Batalha em vista do pai, Guilherme de Lemos Branco, ter sido nomeado chefe da Repartição de Finanças do nosso concelho. A Torres Novas haveria de voltar, aí tendo frequentado o Colégio de Santa Maria, da ordem das irmãs do S. José de Cluny, onde tirou o curso liceal. Regressou à nossa Vila, vindo a contrair matrimónio com o engenheiro Joaquim Sales de Oliveira Simões, membro da conceituada família do Comendador Joaquim Sales de Simões Carreira, figura proeminente da Batalha dos fins do século XIX e princípios do século XX, proprietário da Quinta do Fidalgo onde se situa um dos já raros solares setecentistas da nossa região. A D. Maria Adelaide vive há longos anos nessa quinta.
Creio que a sua primeira paixão pelas Artes foi a da pintura, cedo começando a evidenciar grande vocação e a realizar uma obra de qualidade indiscutível, a que já tive a honra de me referir no “Baú da Memória”. Várias das suas obras foram adquiridas por colecções particulares, nacionais e estrangeiras.
Um pouco mais tarde começou a evidenciar-se na Poesia, publicando três obras que creio do melhor que se tem dado à estampa no nosso País. Trata-se de “Voltada para Mim”, em 2003, “A Dimensão do Olhar”, em 2007 e “Arquivo Plural” em 2010.
Foi–me extremamente difícil escolher dois dos seus poemas para ilustrar esta página, tal a qualidade, a profundidade e a beleza que todos evidenciam. E é curioso referir que encontro a mesma elevação noutra grande poetisa a que me vou referir também, a leiriense Maria da Encarnação Baptista.
HÁ DIAS ASSIM
Como a manhã radiosa, fui manhã
Asa, flor, abelha, mel
Chama acesa em seu esplendor.
Fui sol da tarde ancorada
No abraço febril do poente.
Assomo brusco de revolta
No grito fugitivo da noite.
Há dias assim, enigmáticos
De cambiantes raros, irrepetíveis.
(De “Voltada para Mim”)
EMBALA O VENTO
Embala o vento neste dia enxuto
Os ramos desprovidos de folhagens
Braços vazios, súplicas, linguagens,
Ecoam pelas horas do meu luto.
De solidão a terra sofre e cala
Vagos e frios todos os espaços
Onde a ausência de alguém
Sempre nos fala.
(De “A Dimensão do Olhar)
Este volume tem prefácio do professor metodólogo Dr. Luís Simões Gomes.
Como os leitores já sabem, com certeza, o neto da Pintora e Poetisa, historiador Dr. Francisco Oliveira Simões, é brilhante colaborador do “Jornal da Batalha”.
Maria da Encarnação Baptista
Nasceu em Leiria em 1924 e nessa cidade veio a falecer nos anos 60. Os primeiros versos foram publicados no prestigioso semanário “Região de Leiria” fundado pelo seu pai José Baptista dos Santos e mais tarde dirigido pelo seu irmão José Ângelo. Vários dos seus poemas foram também publicados nos “Cadernos de Poesia”, na “Távola Redonda”, em “Sítio” e “Árvore” e no “Jornal de Sintra”. Em 1951 sai o seu primeiro e único livro “Hora Entendida”, editado pela Editorial Inquérito e prefaciado pelo poeta, crítico literário e ensaísta Dr. Adolfo Casais Monteiro.


Trata-se de uma obra de invulgar qualidade, ombreando, aliás como sucede com Maria Adelaide Oliveira Simões, com os melhores poetas nacionais. Maria da Encarnação Baptista devia merecer a Leiria a reedição deste seu livro, se possível enriquecido com outros poemas publicados e, possivelmente, pelos que teriam ficado por publicar. É um desafio ao “Região de Leiria” e à própria Câmara Municipal da capital da Alta Estremadura.
Eis dois dos seus poemas, inevitavelmente dos mais curtos para caberem no espaço dos “Apontamentos”.
HÁ QUALQUER COISA EM MIM
Há qualquer coisa em mim que está fechada
à chave…
Qualquer coisa que me faz desesperar,
Qualquer coisa ignorada e que só sei
ser mais importante.
Qualquer coisa que me diz: Vem-me buscar
ó encarcerada em ti mesma!
TRAGO NOS LÁBIOS
Trago nos lábios
palavras insonhadas
E nos passos
caminhos por nascer
Sinto nos olhos
a luz das madrugadas
E nos braços
a força de as romper
Pesam-me os ombros
promessas esquecidas
E medonhos
os dias sem esquecer
Abrem-me os dedos
rosas nunca entendidas
E nos sonhos
a ânsia de as colher
Trago o clamor
das mãos acorrentadas
E antigo
o crime de as conter.
Sinto a abrir
asas insuspeitadas
Ai amigo
nada as pode vencer.
Capela da Senhora do Caminho
Vai beneficiar de obras de restauro. O pequenino templo tem valor histórico por ter pertencido à Ordem Dominicana, incrustado como estava no muro da Cerca Conventual, tem valor arquitectónico por ser um dos, cada vez mais raros, exemplares do barroco rural, e evidentemente, tem valor religioso, tanto mais que é um pequeno santuário de grande devoção dos batalhenses.
Preservá-lo e cuidar dele é uma obrigação de todos nós.
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