Diabos e “Homens Verdes” no Mosteiro de Santa Maria da Vitória
Termino esta ronda, que veio na sequência de outras publicadas ao longo de décadas, sobre o nosso Mosteiro, neste caso sobre os aspectos mais invulgares e menos visíveis do monumento, como os diabos e os “homens verdes” esculpidos quase sempre em capiteis que estão em pontos quase inacessíveis aos nossos olhos.
Numa imagem de vulto do Arcanjo São Miguel, que teria estado na capela de sua invocação (a que se situa junto à porta lateral), o Arcanjo Custódio da Pátria Portuguesa esmaga um demónio, escultura quatrocentista de excelente talhe que no momento se encontra em exposição no Museu da Comunidade Concelhia da Batalha. Contrariamente ao demónio que provoca e ofende Nossa Senhora, com um gesto obsceno, no conjunto da Senhora do Ó do capitel de Santa Bárbara, capela onde presentemente se adora o Santíssimo, o que é espezinhado pelo Arcanjo tem esgares de sofrimento, como é natural. Reproduzo, aqui, em pormenor, e em esplêndida fotografia de António Luís Sequeira, a figura demoníaca do conjunto da Senhora do Ó.
Os “homens verdes”, que evidentemente nada têm a ver com os demónios e que possivelmente significarão o pulsar da vida e o renascimento e a renovação constantes, talvez com a mesma mensagem da gárgula que expele pela boca outro ser humano, são figuras humanas, em corpo inteiro ou só uma cabeça, que expelem, também pela boca, ramagens abundantes, frequentemente acantos.
No Mosteiro encontramos duas, mas talvez haja mais alguma, a que se reproduz, também numa fotografia de António Luís Sequeira, e que está no capitel da quinta coluna da igreja do lado esquerdo de quem entra pela porta principal, no conjunto de anjos músicos, e a da Casa do Capítulo no seu canto nordeste.
Sobre a da Casa do Capítulo há uma lenda curiosa, que se sabe não passa de uma lenda e nas lendas nem tão-pouco o seu fundo é verdadeiro como sucede na maior parte dos casos, apresentando-nos esta escultura dum “homem verde” como se tratasse do mestre Huguet a proferir blasfémias por não ter conseguido levar avante a construção da portentosa abóbada que cobre esta quadra conventual, enquanto que a escultura do canto sudeste evocaria a do mestre Afonso Domingues. Ora, ambos os “arquitectos” foram mestres geniais, Afonso Domingues ao delinear a primeira parte da Obra e ao executar quatro capelas absidais, as naves laterais da igreja, a sacristia e os lanços sul e leste do Claustro Real, mas não chegando a fazer a abóbada da Casa do Capítulo que é, com certeza, da autoria de mestre Huguet porque são as suas nervuras características que sobem até ao fecho. Além disso, seria impossível até 1402, em que Afonso Domingues morre, se não morreu no ano anterior, ter-se-á erguido a abóbada. As obras começaram pouco antes, crê-se que em 1388, medeando apenas catorze anos, ou mesmo um pouco mais, até à nomeação doutro mestre. É muito pouco tempo para um empreendimento como este.
É pena ainda se saber tão pouco sobre a figura de Afonso Domingues, que parece ser natural de Lisboa. Onde foi sepultado? Teria falecido na Batalha, na altura em que ainda era o mestre da obra conventual? E se faleceu na Batalha estaria, muito possivelmente, sepultado na Igreja de Santa Maria-a-Velha, que ele com certeza construiu e que veio a ser um verdadeiro panteão dos mestres batalhinos. A destruição deste templo foi um rasgar de várias páginas não só da história local mas da história dos grandes mestres quatrocentistas que dirigiram as obras do Mosteiro e outras pelo País fora.
De Huguet, que se supõe ser catalão, sabe-se muito mais e inclusivamente que morreu na Batalha em 1438 e que foi sepultado, embora em desassossegada sepultura, ainda por cima profanada no século XX, em Santa Maria-a-Velha. Conhece-se bastante do seu percurso no Mosteiro.
As únicas coisas que se salvaram deste histórico templo foram algumas pedras e a cobertura legendada da sepultura do mestre Boitaca, agora à guarda e em exposição permanente no Museu da Comunidade Concelhia da Batalha.
José Travaços Santos
Apontamentos sobre a História da Batalha (189)
Divisão a divisão, a Casa da Cultura do Rosas do Lena
No terreno que o Rancho Folclórico Rosas do Lena adquiriu, onde construiu a sua sede e tem outros serviços, havia um palheiro que habilmente se transformou numa “Casa de Cultura”.
No rés-do-chão foram instalados, além dum átrio com várias funções, uma biblioteca etnográfica, embora com outras vertentes, e uma taberna à moda antiga. No piso superior, no espaço onde se guardava a palha, fez-se uma sala ampla para reuniões, sendo aqui que normalmente se realizam as assembleias gerais do agrupamento, e instalou-se um gabinete para a direcção e um amplo roupeiro para guardar os trajos que não estão a ser usados, não os da recolha que estes estão preservados no Museu Etnográfico. Tudo espaços visitáveis.
Na fotografia vê-se o exterior do imóvel, agora enriquecido com um conjunto escultórico feito e oferecido pelo artista canteiro batalhense Armando Pinheiro, justíssima homenagem à pioneira Escola de Concertinas e Harmónios do Rosas do Lena e aos eu mestre e impulsionador Joaquim Moreira ruivo, uma figura de destaque do movimento folclórico e da cultura popular portuguesa. Na frente, um amplo pátio e uma eira onde no Verão é frequente realizarem-se os ensaios do agrupamento. - J.T.S
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