Francisco Oliveira Simões

Crónicas do Passado

Benjamin Rabier

Este mês, no Museu Bordalo Pinheiro, é inaugurada uma exposição intitulada “Benjamin Rabier - Ilustrações do Romance da Raposa de Aquilino Ribeiro”, por isso, cabe-me apresentar as histórias que levaram a esta tão importante mostra artística.

Durante o período de estadia de Aquilino Ribeiro em Paris, o autor travou conhecimento com o desenhador Benjamin Rabier. Daí resultou uma colaboração que ainda hoje ecoa na nossa literatura. “O Romance da Raposa” foi publicado em Portugal no ano de 1924, com a linguagem da Beira Alta de Aquilino e as ilustrações de Benjamin.

Rabier nasceu em La-Roche-sur-Yon, em França, no dia 30 de Dezembro de 1864. Em 1889, após completar as suas obrigações militares, partiu para Paris. Começou por trabalhar no Bon Marché como contabilista. Mas após conseguir o apoio do desenhador e caricaturista Caran d´Ache, dá-se inicio à sua participação artística em variadas publicações, entre elas a La Chronique Amusante. Em 1897 cria um dos seus mais famosos personagens, Tintin-Lutin, que partia para Moscovo nesta primeira aventura. O desenho em linha clara, estilo preconizado por Rabier, a imagem física do herói, o destino geográfico e até o nome serviram de inspiração a Hergé para catapultar o protagonista das suas histórias, Tintin. Na verdade, Benjamin Rabier é a maior influência e modelo para o jovem Hergé, não é por acaso que se trata de um dos pais da Banda Desenhada.

Já que estamos a falar de plágio, tenho que prevenir que Aquilino Ribeiro também não foi original quando publicou “O Romance da Raposa”. Já anteriormente Rabier havia ilustrado uma edição francesa desta aventura sobre uma raposa matreira, no ano de 1909. Mas se continuarmos a viajar no tempo percebemos que o texto original data de finais do século XII. “Le Roman de Renart” foi escrito em francês arcaico com as contribuições de vários poetas e clérigos. Teve a sua mais antiga existência no escrivão flamengo Nivard de Gand, que em 1148 escreveu em latim o “Ysengrimus”, nome do lobo rival de Renart. É notória a influência das fábulas de Esopo, onde os animais falam e transmitem sempre uma moral. Enquanto hoje achamos este romance uma história infantil, na época medieval a perceção era bem diferente. A raposa fazia tudo o que caracterizava o ser humano, mesmo combater nas cruzadas. Todos os animais representados naquelas páginas eram uma metáfora para os vários quadrantes da sociedade feudal. No inicio do século XIII, Santo António também utilizava os animais nos seus sermões, com o propósito de apontar os pecados do Homem. A Igreja usava o “Roman de Renart” como meio de educar os seus fieis. A quantidade de escritores que se guiaram por estas narrativas são incontáveis. O objetivo de La Fontaine, quando escreveu as suas fábulas, era adaptar os contos de Renart para a sociedade francesa do século XVII, a fim de a satirizar e corrigir. Aquilino Ribeiro teve uma abordagem similar, dando um ambiente, língua e costumes bem portugueses.

Curiosamente, Benjamin Rabier também chegou a ilustrar uma edição das “Fábulas” de La Fontaine. Em 1916 desenhou a imagem da marca La Vache qui Rit, que ainda hoje perdura. Apesar de ter morrido em 1939, o seu nome e obra viveram por ele até aos nossos dias.


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